Casa Macário - Há mais de cem anos a moer café
As máquinas centenárias de origem inglesa ainda moem o grão de café. As misturas são as que o cliente quer e na grossura indicada para a máquina que verterá uma das bebidas preferidas dos portugueses. Na Casa Macário, em Lisboa, o grão de café é protagonista entre uma variedade de produtos nacionais, com destaque para a garrafeira de vinhos do Porto.
Sara Pelicano | segunda-feira, 12 de Abril de 2010
O café, cedo se tornou um elemento fundamental na mesa dos portugueses. Foi testemunha das longas tertúlias passadas em locais tradicionais como a pastelaria Brasileira, em Lisboa. O sabor e aroma daquela bebida, cuja matéria-prima chegava do ultramar, conquistou os portugueses.
O café faz parte da lista de compras. Adquire-se no supermercado já moído, pronto a juntar água e consumir. Mas, na Casa Macário, na Rua Augusta, em Lisboa, ainda se mói o grão de café na quantidade que o cliente quiser, tendo em conta o tempo que o levará a consumir. Não se pode moer demasiado, porque rapidamente perde propriedades. O cliente pode também dizer que mistura de café deseja.
A proveniência é-nos indicada de forma clara: da Colômbia, de São Tomé e Príncipe, um desfile que passa por outras geografias do café. Pequenos grãos distribuem-se pelos recipientes junto às estantes centenárias. «Excepto as lâmpadas, todo o material é de origem. Da época de abertura da loja pelo senhor Macário, em 1913», conta Luís Alves, sócio-gerente deste espaço tradicional da capital.
A loja, repleta de recantos onde espreita sempre mais um produto, está decorada com mobiliário feito de pormenores, motivos orientais, gavetas e gavetinhas, montras e prateleiras.
O senhor Macário, fundador da loja, queria inicialmente abrir uma ourivesaria. No entanto, os sabores da alfarroba, do milho, dos chás, entre outros, tornaram-se senhores. Na época, o café ganhou destaque entre as iguarias da Casa Macário. Ainda hoje existe uma lista com as misturas que as pessoas gostavam de consumir. «Mantemos umas dezoito activas. As pessoas, por tradição familiar, continuam a vir comprar essa mistura», diz Luís Alves.
O ofício de comerciante levou o nosso entrevistado a ter um vasto conhecimento sobre café. Com saber feito nos 14 anos de gerência da Casa Macário, deixa algumas dicas: «O café faz-se de diferentes maneiras e, para cada uma delas, utiliza uma moagem própria. A moagem mais fina deve ser utilizada para fazer café à moda antiga, numa cafeteira de mexer. É o chamado café à turca, em que o café tem de estar moído praticamente em pó. Já um expresso requer uma moagem fina para criar o creme. Se fizer moagem grossa o café fica preto. Na cafeteira, tipo italiana, o grão quer-se mais ou menos grosso. Se for muita fina cai entre os furos do filtro. Já máquinas com filtro de papel, requerem uma moagem grossa».
O avô de Luís adquiriu o espaço em 1974 e introduziu alguns vinhos. O vinho do Porto é protagonista nesta garrafeira, «por ser um cartão-de-visita do país», esclarece Luís Alves. A mais antiga garrafa de vinho do Porto na Casa Macário data de 1900.
Alguns turistas entram na loja. Olham curiosos para as garrafas cheias de pó e com um letreiro a dizer: «não limpar o pó». Acabam por levar algumas iguarias da Casa Macário. Chocolates, rebuçados de Portalegre, bolachas. «Tento que tudo seja produtos portugueses», esclarece.
Recentemente, começou a ter nas prateleiras azeite. «O turista já pede azeite português», diz. Os empregados, alguns com mais de 30 anos de casa, andam num corrupio entre os corredores apertados. Ouvem-se pedidos do «costume» e outros novos, entoados numa língua estrangeira.
Já na porta. Em cima da calçada portuguesa onde se escreve «café, chá e chocolates» com pedras mais escuras, sobressaindo das brancas, Luís Alves diz: «Vou dar-lhe mais uma dica de café». Prestamos atenção: «O café moído conserva todas as propriedades durante dez dias. A partir daí começa a perdê-las. Mas, para o conservar mais tempo, guarde-o numa embalagem de plástico hermeticamente fechada e, preferencialmente, no frigorífico». Termina com um piscar de olho, que poderia ser traduzido pela célebre frase do jornalista Fernando Pessa: «E esta, hem?».