De uma só vez, Paulo perdeu três familiares. Chorava a morte da filha mais velha, que viajou com os avós Laura e Domingos, seus sogros. Também estes não sobreviveram à tragédia, que, daquela família destroçada, só poupou a pequena Tânia, de 10 anos. A menina chegou ontem a Lisboa e ficou logo internada no Hospital de Santa Maria, na Pediatria. O seu estado é considerado grave.
"Ela acompanhava-os para todo o lado. Desde os sete anos que ia com eles para vários sítios", disse o pai de Ana Sofia, com a voz embargada. "Nunca mais a vou ver na piscina que mandei construir só para ela. O pior ainda está para vir. Quando acordar e não a vir no quarto dela ou quando chegar a casa e ela não estiver. Recebia-me sempre com um grande sorriso", recordava o pai, com tristeza.
Ana Sofia estava agora no 12º ano, na escola Secundária de Madeira Torres, em Torres Vedras, era catequista e socorrista. Ajudava ainda os pais na banda Os Primos, que actuava em festas. "Éramos uma família de grandes alegrias. Agora acabou tudo", disse Paulo, ao mesmo tempo que abraçava o pai, Virgílio, de 69 anos, que não acreditava na morte da neta. "Ela era tudo para mim", disse a chorar.
Helena Silva, testemunha do acidente, foi uma das que viram e mais sentiram a tragédia daquela família. Não esquece a pequena Tânia. "Há uma imagem que não me sai da cabeça, que é a menina entalada entre uma pedra e o autocarro, e com o corpo da avó por cima. Esteve lá presa cerca de uma hora. Nunca vi nada assim", disse a jovem, que não poupa críticas a tudo o que se passou a seguir. "Havia marroquinos a ajudar e outros a roubar, as pessoas do staff do barco foram péssimas, não diziam nada, uma menina que tinha perdido a avó veio com uma passageira, sem acompanhamento da tripulação".
LÁGRIMAS RECEBEM 'FUNCHAL'
Dor, tristeza, alegria, alívio. Um misto de emoções que ontem à tarde se viveu na Doca de Alcântara, em Lisboa, assim que o paquete ‘Funchal' surgiu no horizonte, no rio Tejo, pouco passava das 17h00. Sentimentos que transbordaram na altura em que amigos e familiares puderam, finalmente, abraçar os sobreviventes da tragédia. Para trás deixaram nove mortos e cerca de quinze feridos e na bagagem trouxeram memórias trágicas.
Sete ambulância da Cruz Vermelha transportaram para o Hospital da CUF os feridos que vinham a bordo. Os outros só saíram cerca de uma hora depois de o barco ter atracado, naquela que foi uma espera angustiante.
José Carvalho, de Alcabideche, esperava impaciente pelo filho e por dois sobrinhos. Em Marrocos, ficaram as cunhadas Maria da Conceição, operada à coluna, e Teresa Seguro, que correu o risco de amputação de uma perna. "A Conceição levou os miúdos, porque tinha-lhes feito uma promessa. Assim que vimos o acidente na TV, calculámos logo que podiam ter sido eles. Elas iam no autocarro, mas os miúdos ficaram na piscina".
Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/actualidade/senti-logo-que-ela-estava-morta