Depois de Ana Jorge dizer que não cabe à tutela participar as situações de propagação intencional de gripe A, a Procuradoria-Geral da República avisou que "todos os que exercem funções públicas estão obrigados por lei a denunciar" os casos que são crimes públicos
O procurador-geral da República deixou ontem claro que o Ministério da Saúde tem de denunciar os casos de propagação intencional de gripe A (H1N1) que chegam ao seu conhecimento. Depois de a ministra Ana Jorge ter dito ontem que não cabe à tutela, nem à ministra, participar as tentativas de contágio com gripe A ao Ministério Público, a Procuradoria-Geral da República avisou que "todos os que exercem funções públicas estão obrigados por lei a denunciar factos de que tenham conhecimento relacionados com a propagação de doença contagiosa", um crime público.
Em comunicado, a Procuradoria diz que "o Ministério Público investigará todas as denúncias que forem apresentadas" e informou que aguarda que "sejam comunicados factos concretos".
A polémica surgiu depois de Ana Jorge ter alertado em conferência de imprensa para "comportamentos anti-sociais" de adultos que recusaram usar máscara de protecção e de mães que declararam que levariam os filhos às urgências dos hospitais para contagiar outras pessoas. Como "a propagação de doença contagiosa é um crime público", punido com uma pena até oito anos, a denuncia é obrigatória para funcionários, segundo o artigo 242 do Código de Processo Penal, lembra fonte do Ministério Público (MP).
Opinião partilhada pelo ex-bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves. "Se ninguém comunicou o caso às autoridades, a ministra tinha a obrigação de fazê-lo, já que todos os que exercem funções públicas têm esse dever", diz. Para Rogério Alves, as declarações públicas da ministra, ao atribuir intenção de propagar a doença nos casos revelados, criaram uma situação que obriga o Ministério Público a investigar". Portanto, "a ministra vai ter de dizer ao MP quais os casos de que teve conhecimento", conclui.
Para o procurador João Palma, Ana Jorge tem de "dizer onde e quando o crime ocorreu, o lugar, e identificar quem são as pessoas que tiveram essa prática de tentar propagar a gripe".
Mas Ana Jorge, por seu lado, defende que as declarações que fez segunda-feira tinham um "objectivo pedagógico". Por isso, salientou que a decisão de participar as situações de contágio propositado de gripe A ao Ministério Público cabe aos serviços de saúde onde estas ocorram.
No entanto, o bastonário da Ordem dos Médicos, Pedro Nunes, rejeita a ideia. "Os médicos não vão participar nada às autoridades. Temos o dever de curar, não de policiar", conclui. Além disso, lembra que o estado emocional de quem chega às urgências, preocupado com o filho, deve ser tomado em conta quando se pensa em acusar alguém. Já o director clínico do Hospital de São João, António Oliveira e Silva, diz que faz parte da função do hospital comunicar esses casos, considerando que por vezes a saúde pública está acima do sigilo médico.
DN