Em caso de culpa hospitalar e danos irreversíveis, doentes podem aspirar a indemnizações da ordem dos 30 mil euros. O máximo alcançado em tribunal foi de 200 mil euros. Dois doentes do Santa Maria continuam sem conseguir ver
Os doentes que perderam a visão na sequência do tratamento recebido no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, poderão ter de esperar oito anos em tribunal por uma indemnização da ordem dos 30 mil euros, caso as lesões se revelem irreversíveis e se prove haver responsabilidade hospitalar. Esse é, pelo menos, a média da jurisprudência portuguesa nestes casos, disse ao DN o jurista da Ordem dos Médicos, Paulo Sancho.
"A nossa jurisprudência anda por valores muito baixos para os casos de negligência hospitalar ou erro médico, com indemnizações que, na esmagadora maioria dos casos, não vão além dos 10, 20 ou 30 mil euros", precisou o jurista. Os valores máximos atingem os 200 mil euros, mas só em casos muito particulares, que normalmente estão associados a um rendimento elevado do doente, a uma maior esperança de vida ou à existência de menores na sua dependência.
Paulo Sancho diz que os processos de responsabilidade civil extracontratual se arrastam nos tribunais, apontando que a regra é um período de 8 e 10 anos, havendo casos em que atinge os 15 anos. A administração do Santa Maria já admitiu que caso o inquérito em curso revele culpa hospitalar assumirá as responsabilidades.
A hipótese de o hospital ter de indemnizar os seis doentes está em cima da mesa, enquanto decorre o inquérito da Inspecção-Geral da Saúde e do Infarmed. Ontem - seis dias após a injecção intra-ocular com o medicamento Avastin - dois dos seis doentes com endoftalmite continuavam sem ver, apesar dos tratamentos com antibióticos, pomadas e pingos para os olhos. Dos restantes, dois revelam melhorias ligeiras e os outros estão em situação estacionária.
A situação foi descrita ao DN pela familiar de um dos doentes e corroborada pelo presidente do hospital, Adalberto Campos Fernandes. Apesar disso, o mesmo responsável garantiu que a equipa clínica continua esperançada na sua recuperação. Para isso garantiu ontem aos doentes que caso sejam necessárias intervenções que só existam no estrangeiro, estes podem escolher entre hospitais na Índia, Inglaterra ou Espanha, a custas do hospital
A polémica em torno da decisão de continuar a usar o Avastin - apesar de terem sido registadas 361 efeitos adversos no Canadá o que levou o fabricante, Roche a alertar os profissionais de saúde para o facto de o medicamento não ter indicação para tratamentos aos olhos - adensou-se depois de o Centro Hospitalar de Lisboa Central ter revelado que deixou de usar o produto em Outubro de 2008 por não ter aprovação para uso oftalmológico. Outros cinco hospitais, Capuchos, São José, Desterro, Santa Marta e Estefânia, suspenderam ontem o uso do remédio, até à conclusão da investigação.
Em declarações ao DN, fonte do Infarmed disse que os exames aos dois lotes do medicamento usados em Santa Maria continuam, mas também a outros materiais cirúrgicos, garantindo que os resultados serão conclusivos. A deficiente esterilização e contaminação da ampola são apontados como outros cenários prováveis.
DN